terça-feira, 19 de junho de 2012

Stand-up Comedy Francesa

Sempre notei uma grande quantidade de cartazes de apresentações de "comediantes-cara-limpa" espalhados pelas ruas parisienses. Isso, há mais de 20 anos. Como prefiro figurinos bufantes e textos bordados à la Molière, nunca flertei com esse gênero de comédia até mudar-me para a França, onde a cultura do showman é sólida, fica atrás dos Estados Unidos, mas muito à frente do Brasil.

Em São Paulo, a stand-up comedy despontou com Marcelo Mansfield “ciceroniando” uma trupe de jovens atores (Clube da Comédia), elencado por Rafael Bastos, Marcela Leal, Diogo Portugal entre outros. Tive a oportunidade de assistir a várias dessas apresentações. O Mansfield tinha “punch”, gosto dele e do seu humor, é macaco velho, mas sempre achei esses “jovens talentos” sem graça, agressivos e evasivamente experimentais.

Uma década depois, alguns deles ficaram populares, com programas na TV, são figurinhas carimbadas nas mídias impressa e digital. Nenhum tornou-se um vrai showman, na minha opinião de expectador. Acredito que não basta apenas causar polêmica ou ser cara de pau, o humorista tem que ter graça (redundante, não?), escrever sketches ácidos, divertidos – o ator-cara-limpa tem a obrigação de cutucar o racismo, não de ser racista.

Admiro Jerry Seinfield e Andy Kaufman. Coincidência, ambos judeus? Eu sei, venero os comediantes americanos e os com carreiras mais sólidas. Sorry, mas a escola está lá... Porém foi em Paris que comecei a curtir o gênero, seus comediantes têm o savoir-faire, não portam ar de arrogância ou amadorismo e sim de frescor. Em Paris, há a cultura do público em assistir e lotar grandes salas e até estádios de futebol para assistir aos talentos da stand-up comedy francesa.

Esses comediantes seguem carreira na televisão, no cinema ou vivem somente do microfone, do palco e da cara limpa. Menciono abaixo alguns dos principais humoristas franceses (asseguro, são muitos!), da nova e da antiga safra, jovens e macacos velhos, que têm elos em comum como o talento, a graça, a humildade, o público e os ótimos salários. E que, mesmo no escracho, são elegantes:
Kev Adams – nascido em Paris, 21 anos e 1o de carreira
“Eu era feio no colégio e, por isso, obrigado a ser engraçado. Fazer o palhaço era a única maneira de existir” – diz o ator Kev Adams que representa a geração ultra jovem de comediantes franceses. Em seus sketches, os temas recorrentes são Facebook, Justin Bieber, angústia e prazeres estudantis na era da das mídias digitais.  Com veteranos da escola cara-limpa, Kev sempre está presente nos festivais de stand-up comedy e segura muito bem a bola. Atualmente, atua na sitcom SODA (verlan ADOS, de adolescente) onde interpreta um adolescente no seio de uma família parisiense e que vive suas desventuras colegiais ao lado dos amigos losers. A sitcom tem feito bastante sucesso na França, mais de 244 capítulos já foram rodados. http://kevadams-officiel.fr/


Norman-   nascido em Arras, 25 anos e + de 5 de carreira
Seu alter-ego é educado e engraçado, ele interpreta o papel do bom-moço (ele mesmo, o Norman). O jovem humorista, creia, levou 3 mil pessoas ao Gran Rex em Paris para assistir o seu espetáculo Zapping Amazing. Seus sketches discorrem sobre angústias da adolescência versus o dilema em tornar-se adulto - um dos mais populares é Bilingües onde Norman questiona a geração francesa americanizada. Um outro sketche  “bem freqüentado” é  o Devenir Adulte - hilário quando ele narra a dificuldade em ser adulto e deixar a camiseta para usar camisas... Nó na gravata? Nem seu guru, o Santo Google o ajuda. Segundo o jovem comediante, no colégio ele fazia parte do clube dos losers, era alvo de piadas por ser um bom aluno, fazer esporte etc. Hoje ele é popular, mas do coté loser. http://normanfaitdesvideos.com/


Alex Lutz – nascido em Estrasburgo, 34 anos e 10 anos de carreira
Ele não é tão jovem nem tão popular como Kev ou Norman, mas faz parte da mesma safra de humoristas. Com rosto angelical, em seus espetáculos solos, caricaturiza personagens do dia-a-dia como vendedoras, atrizes de novelas “mexicanas” ou celebridades - e aproveita para explorar seu sotaque germânico. Atua em programas televisivos como SODA e , atualmente, tem um quadro no Petit Journal (Canal +) onde interpreta uma mulher que fala sobre amenidades, no melhor estilo-temas de “salão de cabeleireiro”. Alex sabe interpretar, de maneira delicada, mulheres hilárias. E se dá muito bem, é ácido e elegante ao mesmo tempo. Não tem site :O( .


Gad Elmaleh – nascido em Casablanca, 41 anos e 25 de carreira
Considerado um dos comediante mais populares da França, faz cinema e TV. Atingiu grande fama com o filme La Verité si Je Mens 2 (2001). De fato, Elmaleh pertence à escola do one showman, canta, dança, escreve, dirige e tira muito sarro. Adultos e adolescentes o adoram. Seu alvo é qualquer personagem do cotidiano. Segundo o humorista, no colégio, era tímido e fazer piadas foi a maneira que ele encontrou de entrar em contato com os alunos, professores etc. Nessa época, tinha mania de inverter as palavras e, assim, entre risadas, ganhava popularidade no colégio. Le Blond é um dos seus sketches mais visitados, nele, o ator retrata um homem/pai/marido perfeito em relação aos demais. 
http://gad-elmaleh.info/

Anne Roummanoff – nascida em Paris, 41 anos + de 20 de carreira
Sempre de vermelho, em seus espetáculos one women show, essa humorista da velha guarda tem como alvo a política e a aborda de maneira insolente, sem ser agressiva. Apesar de fazer humor para adultos, tem popularidade junto ao público jovem. Foi Roummanoff que ajudou a despontar a carreira do jovem Kev Adams, dando carta branca ao ator para criar um sketche e participar de uma importante apresentação do stand-up comedy junto a ela, Gad Elmaleh e outros comediantes de peso. A humorista contou que, em sua época do colégio, era insolente com os professores, adorava fazer perguntas desconcertantes que acabavam por tirar gargalhadas de seus colegas de classe. Roummanoff criou um sketche "presque parfait" onde ela mostra como uma colegial francesa se porta e paquera.  http://www.anneroumanoff.com/

Jamel Debouzze – nascido em Paris , 35 anos e 20 de carreira
Quando convidado para dar entrevista em qualquer  emissão de TV (ao vivo, principalmente), o telespectador já espera dele alguma “arte” que desconcentra os âncoras do programa. Jamel é o mestre improviso. No cinema, ficou conhecido mundialmente com participações nos filmes “Amélie Poulain” e “Asterix”, porém muito antes estrelou  sitcoms da TV francesa. Seu forte, sua escola, é a comédia de cara limpa. O fôlego e a pegada que Jamel tem são explosivos. De origem humilde e estrangeira, deficiente de um braço, podemos dizer que ele é o “cara”, com talento nato para a comédia, há décadas atingiu o apogeu e ainda permanece no pedestal como o melhor e o mais bem pago humorista francês. http://www.jameldebbouze.fr/

9 comentários:

  1. muito bacana o texto!!! pena q não sei frances, senão acompanharia mais de perto o humor desse pessoal

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    1. Vini querido! Sim, uma peninha. Mas algumas "mímicas" são compreensíveis e hilárias. Quem sabe?!! Ah, estou na torcida pro lançamento do seu livro hj em São Paulo: "O Amor nos tempos do blog". Um GRANDE beijo.

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  2. Thx, Vivi, ou melhor, merci, Vivi pelo post. Numa época em que os stand-ups bombam no Brasil, é muito bom ter alguém para nos mostrar o que está rolando aí em Paris.

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  3. Edgar, então proponho o desafio:. Mande dae (pra genta daqui) sua persperctiva da stand-up comedy atual brasileira. E ae, topa? Adoraria ler um texto seu a respeito. ;O)

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  4. Veep, que máximo!!
    Adorei! Vou poder correr atrás de umas boas comédias (praticando frances ao mesmo tempo!!) agora!
    Maravilha :)
    Beijocas e bom conhecer o blog!
    Anna Mortara

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  5. Anna, o bom é que podemos ver alguns desses humoristas franceses ao vivo e juntas. ;O) Mas enquanto o lobo não vem, eu coloquei o link (en vermelho no texto) de cada um dos sketches que citei. Clique neles, e assista. Depois me conte. Bjao.

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  6. Veep, muito legal o texto e bem informativo. Não tinha ideia que o Stand Up francês fosse tão relevante. Desses só conhecia o Jamel por causa do filme Amélie Poulain. Bjs!

    Denis Torres

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  7. Denis, nem eu sabia, até 2 anos atrás, que esse genro de comédia pudesse ser tão bom, importante e, como você disse, relevante aqui na França. Adorável (e hilária) surpresa!

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  8. Gostei bastante, Veep.
    Esse assunto é longo.
    O que é o humor? Do que se ri? Pode ser fazer piada sobre tudo e sobre todos? Enfim um monte de perguntas que dão pano pra manga.
    Falando em Brasil, não acompanho e não sei dizer quem presta e quem não presta, para mim, na tal nova geração. Com exceção do Mansfield, nunca vi em cena (nem na tv e nem no youtube) os nomes que você cita.
    Com relação aos antigos, dá uma olhada no youtube no Chico Anísio em preto e branco, de smoking na TV, em 1969. Você vai ver que gente boa tem em qualquer época e lugar.
    Raymond Devos é outro das antigas que fez escola na França. Coluche é outro ícone, idolatrado até hoje, mais de 25 anos depois de sua morte.
    Gad Elmaleh, que você mencionou, é muito bom há muito tempo: inteligente, crítico e, é claro, muito engraçado.
    Philippe Caubère não é stand up comedy, não é one man show como os outros, mas é excelente. Ele está sozinho em cena, por 3 horas, é divertidíssimo, de morrer de rir, fazendo peças com começo meio e fim, sem ser esquetes, sem se dirigir diretamente ao público. Sem fazer piadinhas. Enfim, uma corajosa aula de teatro para quem pretende se aventurar honestamente - poeticamente eu diria - pelos palcos a tentar fazer rir seu público.

    Veep, seu texto joga uma luz no assunto. Levanta uma ótima bola. E isso é ótimo.
    Obrigado por ter mandado.
    Bj,
    Nereu

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